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Acusada de plágio por alunas, suposta jurista coordenou curso e deu aula como doutora em Salvador

As redes sociais de Cátia Regina Raulino mostram a vida de uma professora de Direito e jurista renomada, participantes de diversas lives e com relevância jurídica. No entanto, as coisas se mostraram diferentes na vida real. O extenso currículo de Cátia – incluído até mesmo na plataforma Lattes, que registra a formação de pesquisadores do país – não resiste a uma consulta simples às instituições em que ela diz ter conseguido os títulos. 

Foto : Divulgação

Metro1 buscou confirmar a titulação da “doutora” Cátia na Universidade Federal da Bahia (Ufba), onde ela diz ter apresentado o trabalho “A Aplicação Prática do Mapeamento de Processos” – curiosamente, sem professor responsável pela orientação. O diretor da Escola de Administração da Ufba, João Martins Tude, negou que ela tenha passado pela instituição. 

A “mestra” Cátia Regina Raulino também não existe para a Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc), onde ela diz ter conquistado o título com a tese “A Utilização de Benefícios Fiscais Como Garantia de Sobrevivência Empresarial”, em 2010. Em consulta ao site de egressos da universidade, o nome de Cátia não aparece. 

Nem mesmo a graduação em Direito, que a “professora” diz ter, foi confirmada pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Procurada pelo Metro1 para falar sobre seus títulos, Cátia Raulino disse que preferia “não afirmar nada nesse sentido” – a resposta completa está no fim do texto. 

Com um currículo de dar inveja a muito acadêmico, Cátia Raulino conquistou fama nas redes sociais e sucesso nas faculdades privadas de Salvador. A carreira exitosa levou a suposta jurista a ser coordenadora do curso de Direito da UniRuy (antiga Faculdade Ruy Barbosa) e a ministrar aulas para a graduação de Direito Administrativo e Direito Tributário. Além da Ruy, ela atuou também na Universidade Salvador (Unifacs) e no Centro de Estudo José Aras – um dos “cursinhos” preparatórios para carreiras no meio acadêmico. 

Acusação de plágio – Nas duas instituições de ensino superior, ela orientou alunos que finalizaram a graduação e participou ainda de bancas examinadoras de mestrados em pelo menos duas universidades, entre elas a Ufba. Na sua passagem pela UniRuy, Cátia também orientou Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) de diversos alunos. 

Em contato com o Metro1, Lorena Falcão e Solimar Musse, estudantes que apresentaram denúncia contra Cátia Raulino ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), contam que a então professora plagiou suas obras. 

“O meu TCC iria ser publicado num livro de melhores TCCs do semestre, pois eu tomei 10. Ela me orientou, mas nunca mudou nada de substancial no meu texto. Ela pedia somente para mudar de ordem os parágrafos. Eu vim morar na Irlanda, formei em 2017.2. Apresentei o TCC em 2017.1. Quando saiu o livro, eu já estava aqui. Eu nunca vi esse livro, eu vim descobrir agora, por conta dos desdobramentos, que ela publicou como coautora do TCC, coisa que ela nunca foi. Nunca autorizei isso. Amigos me ligaram perguntando se eu sabia isso. Eu disse que não sabia. Ela publicou meu TCC como se fosse um artigo dela. Ela não rescreveu, ela só trocou o nome”, conta Lorena. 

“Fiz o meu TCC em 2018.1, fui aprovada. Passando um tempo depois, disseram que Cátia iria publicar um artigo com o mesmo tema meu, o meu título, numa revista de Direito Tributário, uma revista internacional. Eu disse que ela poderia escrever sobre o tema, claro, ela era pós-doutora, né? Aí pesquisei com umas amigas e fui ver. Quando vi, tomei um choque. Tremi. Era meu texto ali. Ela só colocou um título a mais, um capítulo a mais. Até as referências eram minhas. Eu passei mal. Mandei meu texto para uma amiga e ela selecionou tudo que era igual, quase tudo. Eu fiquei sem saber o que fazer”, narra Solimar. 

Por conta das duas denúncias – uma de exercício ilegal da profissão de advogada – e dos supostos plágios, Cátia é alvo de pelo menos duas apurações no MP. Contata pelo Metro1 para responder às acusações, ela negou que tenha cometido os delitos e disse que em breve, quando “tomasse pé” das acusações, voltaria a procurar a imprensa. Veja, abaixo, a transcrição da conversa com Catia Raulino. 

“Eu tomei conhecimento hoje [das denúncias de plágio] e a gente tem um comportamento, um costume de publicar em coautoria com o aluno. Em ambos os casos, tenho a publicação com o nome delas, ele foi transformado em coautoria. Essa publicação, com nome de ambas, tem autorização, tudo regularizado. Tomei conhecimento hoje, mas estou supertranquila. 

Caso de Lorena –  Ela pagou 50% do valor para colocar o artigo no livro. O professor divide, para que o artigo seja publicado dentro dessas métricas. Ela pagou a metade dela, sabia como o livro funcionava, tinha troca de mensagens com ela sobre a entrega da publicação. Isso me pegou superdesprevenida, eu não entendo o que tem por trás. 

Caso Solimar –  Eu tenho a publicação em coautoria, da mesma forma que tenho com Lorena. Em eventos internacionais a gente apresenta sozinho, isso é normal. 

Formação Acadêmica – Eu… por conta da segunda denúncia, né? Eu não sou advogada, nunca me apresentei como advogada. Por conta do trabalho com processo eletrônico, trabalhando com dados, esse era um dos pedidos, mas, com relação a essas coisas, isso me pegou de surpresa. Eu fiquei sabendo hoje, só pude consultar os procedimentos hoje. Eu já estou com um advogado criminal que está cuidando do caso para que eu possa entender. Não quero muito conversar sobre isso. 

Mestrado e Doutorado — Eu prefiro não continuar, não afirmar nada nesse sentido. Sei o teor que diz que eu não tenho nada. Quero me resguardar nesse momento. Estou no processo de separar documentação. 

Alterações no Lattes e Biografia após denúncias –  A única coisa que mudei no Instagram foi colocar projeto. E no Lattes, eu estou mudando, pois de seis em seis meses você tem que manter atualizado, é uma determinação do MEC. Eu sempre ajusto, olho. O que eu fiz hoje foi pegar as coisas para saber o que tenho inserido, se coloquei algo errado. 

Trabalho para a Câmara-Chinesa de Comércio – Trabalhei para pesquisa, terceirizada. Não dentro, mas fora da instituição.

Trabalho na Unesco – Na Unesco da mesma forma que foi para a Câmara-Chinesa de Comércio. 

Trabalho na Uniruy – Sim, me sentia capaz [de exercer a função que eu tinha]. Já tinha experiência de mercado de trabalho. Sempre tive excelente feedback de mercado de trabalho. Eu não me sinto confortável de falar, pois ele [o advogado] está tomando pé para saber o que posso falar ou não. 

Eu te prometo que assim que eu tiver acesso e puder entender, eu te prometo que te ligo”.

Da Redação- Luciano Reis Notícias, com Metro 1.